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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Francisca Rojas – 1892 - primeira identificação criminal pelas impressões digitais

A povoação argentina de Necochea, situada a 400 km a sul de Buenos Aires, é, à primeira vista, um local improvável para ficar perpetuado na história da criminalística. No entanto, foi na sua periferia que, em 1892, um duplo homicídio, dos dois filhos de Francisca Rojas, de 26 anos de idade, teve repercussões que perduraram até aos nossos dias.
Ao anoitecer do dia 19 de Junho, Francisca irrompeu aos gritos pela casa de um vizinho, “Velasquez matou os meus filhos”.
Os vizinhos sabiam que Velasquez tinha trabalhado numa propriedade próxima e era um fervoroso pretendente de Francisca. Após mandar o filho chamar a polícia, o vizinho foi a casa de Francisca, onde encontrou as crianças, um rapaz de 6 anos e uma menina de 4 anos, mortos, com graves ferimentos na cabeça. A arma do crime não foi encontrada.
O chefe da polícia esteve a observar o local do crime e indagou sobre o suspeito. Francisca informou que Velasquez, um homem humilde de meia-idade, pouco inteligente, estava perdido de amores por ela, mas que ela tinha ignorado as suas propostas. Na tarde daquele dia, Velasquez tinha sido mais insistente do que era habitual e Francisca decidiu dizer-lhe que estava comprometida com outro homem mais jovem. Velasquez tinha ficado furioso, insultou-a e ameaçou que se iria vingar.
Mais tarde, quando regressava a casa, Francisca viu a porta de entrada aberta e, subitamente, Velasquez saiu do seu interior de forma apressada, quase a derrubando. No quarto ela encontrou as crianças mortas.
Detido nessa noite, Velasquez admitiu as ameaças mas, após intenso interrogatório e violento espancamento, negou sempre ter cometido os crimes. O Chefe de polícia, esperando que o remorso e o medo de retaliação, possibilitassem a admissão da prática dos crimes, obrigou Velasquez a ficar deitado ao lado dos corpos das crianças durante o resto da noite.
Velasquez manteve-se tranquilo e assim continuou apesar de ser submetido a uma semana de torturas implacáveis. Entretanto começaram a circular rumores sobre Francisca e o seu jovem amante, que antes dos crimes, tinha afirmado que se não fossem os filhos casaria com ela.
Por cansaço ou por sensação de estar a investigar o indivíduo errado, o chefe de polícia, esteve uma noite inteira no exterior da casa de Francisca, a fazer ranger as portas e as janelas e imitando o choro de crianças com o objectivo de provocar uma crise nervosa que levasse Francisca a revelar a verdade.  
A técnica de investigação utilizada não resultou. Francisca manteve-se tranquila e reafirmou que Velasquez era o homicida.
Nesta altura foi solicitada a colaboração aos serviços regionais de polícia em La Plata. A supervisionar o Gabinete de Identificação estava Juan Vucetich que, antes da maioria das pessoas, entendia as vantagens das impressões digitais quando comparadas com a Bertillonagem. Em Setembro de 1891, utilizando os ensinamentos de Galton, tinha formulado um sistema de classificação decadactilar para as impressões digitais que posteriormente se expandiu para a maioria dos países de expressão espanhola. Naquela altura Vucetich apenas aplicava o sistema aos presos na cadeia local, mas estava ansioso para o divulgar e difundir.
Quando enviou o Inspector Alvarez para investigar aqueles crimes estava muito longe de pensar que o rumo dos acontecimentos o iria transformar em actor principal na história da identificação humana pelas impressões digitais.
O nível de incompetência policial que Alvarez encontrou em Necochea era assombroso. Velasquez tinha um álibi inatacável para a ocasião em que os crimes tinham ocorrido mas não o tinha mencionado. O jovem amante de Francisca também foi rapidamente eliminado como autor dos crimes ou cúmplice.
 Apenas restava Francisca…
Sem grande confiança, ele pesquisou a casa de Francisca à procura de indícios. Após várias horas, notou uma mancha acastanhada na porta do quarto, visível pela incidência da luz solar. A observação mais pormenorizada, verificou que a mancha era a reprodução de um dedo polegar impregnado em sangue.
Alvarez serrou a parte da porta em que o vestígio se encontrava, levou-a para a polícia e ordenou que Francisca ali se apresentasse.
Velasquez rolou o dedo polegar da mão direita de Francisca numa almofada de carimbo e pressionou-o numa folha de papel. Quando analisadas com uma lupa, concluiu que ambas as reproduções eram coincidentes.
Confrontada com a evidência, produzida pela sua própria mão, Francisca, anteriormente serena e calculista, desfaleceu. Admitiu ter assassinado os filhos porque eram um entrave ao seu casamento com o jovem amante. Depois de os espancar até à morte com uma pedra, deitou a pedra para um poço e lavou as mãos de forma cuidada. Mas, inadvertidamente, tinha tocado na porta do quarto.
Francisca Rojas foi condenada e sentenciada a prisão perpétua, também ela garantindo um papel relevante na história da criminalística ao ser a primeira pessoa condenada em Tribunal através das impressões digitais..
Para Juan Vucetich, o caso foi um triunfo. Em carta a um amigo escreveu: “Quase não posso acreditar, mas a minha teoria provou o seu valor…Agora tenho um trunfo e dentro em breve espero ter mais
Mas a sua confiança foi defraudada e, a desconfiança oficial às impressões digitais, manteve a Bertillonagem como metodologia principal de identificação.
Não desistiu de lutar e, em 1916, conseguiu aprovar e dirigir o Registo Nacional de Identificação destinado a recolher as impressões digitais de toda a população mas a medida foi muito impopular. Dez meses depois, a contestação e algumas desordens terão forçado a suspensão e abandono do projecto e determinada a destruição de todos os seus registos.
Em 1925, Juan Vucetich morreu – alguns afirmam que de desilusão.


Para informação adicional, sobre Juan Vucetich, consultar  http://www.mseg.gba.gov.ar/Juan%20Vucetich/