Uma das mais peculiares vagas de assaltos na Califórnia, começou em Berkeley, em Setembro de 1920, quando um ladrão arrombou uma mercearia, comeu alguns bolos, bebeu uma garrafa de leite e saiu.
Além da utilização de uma serra para o arrombamento, outra particularidade neste caso é que entre os vestígios lofoscópicos recolhidos no local, um digital tinha uma configuração central que se assemelhava a um sinal de interrogação (Question Mark).
O departamento policial era comandado por August Vollmer, que mais tarde viria a ser figura proeminente no desenvolvimento do polígrafo, procurou identificar o vestígio e o autor do crime. Sem sucesso.
Duas semanas depois o ladrão assaltou outro estabelecimento. Utilizou o mesmo método de entrada, foi recolhido o mesmo vestígio digital e, também aqui, demonstrou o seu gosto por leite.
Durante todo o inverno, Berkeley sofreu uma praga de pequenos furtos. Poucos objectos furtados mas nenhum foi recuperado.
Em Abril de 1921, a onda de furtos parou.
À medida que os meses foram passando também os peritos foram esquecendo o original vestígio e do autor dos crimes, entretanto apelidado de QUESTION MARK BURGLER
No entanto, em Setembro de 1921, verificou-se nova vaga de assaltos nocturnos a estabelecimentos: sempre entre as 21h00 e as 04h00, sempre na mesma zona da cidade, o mesmo modus operandi, sempre a garrafa de leite aberta e bebida e sempre o mesmo vestígio lofoscópico.
Os assaltos pararam em Abril de 1922 e recomeçaram em Setembro.
Ao longo da década, os ciclos de assaltos foram constantes.
Em cada um dos ciclos eram furtados bens no valor de vários milhares de dólares.
Neste período, o gatuno esteve perto de ser detido apenas uma vez: um polícia viu um individuo a sair de um estabelecimento e quando o mandou parar, o individuo fugiu. Durante a perseguição houve troca de tiros.
O polícia assegurou que o individuo tinha ficado ferido pelo que os hospitais e médicos da região foram alertados e monitorizados. Ninguém apareceu.
Em 1928, além do vestígio digital, não havia mais pistas. Pelo modus operandi foi assumido que o individuo seria carpinteiro ou canalizador.
Então, por mera casualidade, foi apurado que, todos os anos na primavera uma frota de barcos de pesca saía de São Francisco para a pesca do salmão no Alaska. Além dos pescadores, eram contratadas pessoas habilitadas a rapidamente proceder a diversas reparações.
Foi efectuada a compilação de 38 nomes e moradas de indivíduos com aquelas profissões que foram enviados para o FBI.
Em 1924, o FBI tinha recebido 810.000 fichas com impressões digitais que tinham sido recolhidas em Leavenworth e que integravam o núcleo inicial do que viria a ser o sistema nacional de identificação de impressões digitais planeado e defendido por J. Edgar Hoover, como resposta à crescente mobilidade dos criminosos e ao sentimento de impunidade quando os crimes eram cometidos em lugares afastados dos seus locais de residência.
J. Edgar Hoover, desenvolveu um plano nacional de impressões digitais, concebido como o registo dos criminosos que estaria disponível para todas as entidades policiais do país.
A polícia de Berkley teve um exemplo claro da potencialidade que uma base nacional de impressões digitais tem no combate ao crime.
Em poucos dias, o FBI obteve algo que em oito anos a polícia local não havia conseguido: o nome do assaltante – William Berger.
Berger era um carpinteiro e naquele momento encontrava-se no Alaska. Mas, era também um criminoso cujas impressões digitais tinham sido recolhidas na prisão de San Quentin, onde tinha cumprido pena por furto.
Ficou-se também a saber que a original impressão digital que tinha permitido correlacionar todos aqueles assaltos, correspondia ao dedo médio da mão esquerda.
Fora da sua jurisdição, à polícia restou aguardar o seu regresso.
Assim aconteceu, em Setembro, Berger regressou à sua casa, localizada no meio onde os assaltos eram cometidos. Obviamente que desconhecia que os seus movimentos eram monitorizados pela polícia.
Então, uma noite, Berger saiu de casa. A polícia decidiu esperar o seu regresso para o deter.
Às 4H00, quando se preparava para entrar em casa a polícia abordou-o. Ele fugiu.
Após ser perseguido por diversos quarteirões, tendo ignorado sucessivos avisos, foi atingido mortalmente.
Na morgue foram-lhe recolhidas as impressões digitais e confirmado que a impressão digital do seu dedo médio da mão esquerda possuía a original característica que o havia denunciado e tornado famoso.
Faltava esclarecer um mistério: o que acontecia com os objectos furtados?
O produto de mais de 400 assaltos estava armazenado na sua residência. O dinheiro nunca tinha sido o motivo dos furtos. Berger era cleptomaníaco.
A sua mulher, aterrorizada por um comportamento violento do marido, tinha medo de contactar as autoridades. Ela confirmou que, anos antes, o marido tinha sido ferido a tiro.
Foi decidido que o sofrimento da mulher tinha sido enorme ao longo dos anos pelo que as acusações contra ela foram retiradas.
Lentamente, o sonho de J. Edgar Hoover de estabelecer uma base nacional de impressões digitais foi-se concretizando. Em 1990, o FBI tinha nos seus ficheiros, mais de 83 milhões de fichas decadactilares, que correspondiam e individualizavam mais de 22 milhões de pessoas.
Por dia, eram adicionadas ao ficheiro do FBI mais de 27.000 fichas.
Hoje, os ficheiros são constituídos por impressões digitais de mais de 61.000.000 de pessoas.